segunda-feira, 29 de outubro de 2007

A Carta do Índio Chefe Seattle, "Manifesto da Terra-Mãe"


A Carta do Índio Chefe Seattle, "Manifesto da Terra-Mãe"

Já passaram muitos anos desde que foi escrita, apesar disso, a carta que se
segue, não só continua actual como consubstancia uma crescente preocupação do
homem de hoje.
Foi em 1854 que o chefe Seattle, da tribo Suquamish, do Estado de Washington,
depois de o Governo norte americano ter proposto a compra do território ocupado
por aqueles índios, respondeu ao presidente dos Estados Unidos endereçando-lhe a
missiva que se anexa.
A mesma foi divulgada pela UNESCO em 1976, quando das comemorações do Dia
Mundial do Ambiente.
Não está desfasada das nossas preocupações estéticas e culturais a questão
ambiental ainda que esta temática tenha campo próprio, assim nesse contexto e
ainda pela beleza do texto aqui lhe disponibilizamos a carta.
Quinhentos anos depois da chegada de Pedro Alvares Cabral a Porto Seguro no
Brasil, a preocupação do chefe Seattle natural que era daquele continente, e sem
pretender alimentar polémicas de qualquer espécie, revelou então uma preocupação
à qual felizmente cada vez mais homens e mulheres de hoje, independentemente do
credo filosófico ou religioso com que se identificam, da raça ou do continente
em que se inseram, dão maior importância. E a causa ecológica passou a ser causa
dos povos, e não só do chefe índio.
Ao Chefe Seattle coube a gloria de com o seu perspicaz olhar de homem selvagem,
como ele próprio se intitula , habituado que estava a visualizar o horizonte em
busca de bisontes, que alimentassem a sua tribo, ter vislumbrado antes de todos
a importância da terra mãe para o homem. E viu com o seu arguto olhar que a
terra é nossa mãe e o sol nosso pai, e que podem um dia zangar-se!

Eis o texto da carta:

"Como podeis comprar ou vender o céu, o calor da terra? A ideia não tem sentido
para nós.
Se não somos donos da frescura do ar ou o brilho das águas, como podeis querer
comprá-los? Qualquer parte desta terra é sagrada para meu povo. Qualquer folha
de pinheiro, cada grão de areia nas praias, a neblina nos bosques sombrios, cada
monte e até o zumbido do insecto, tudo é sagrado na memória e no passado do meu
povo. A seiva que percorre o interior das árvores leva em si as memórias do
homem vermelho.
Os mortos do homem branco esquecem a terra onde nasceram, quando empreendem as
suas viagens entre as estrelas; ao contrário os nossos mortos jamais esquecem
esta terra maravilhosa, pois ela é a mãe do homem vermelho.
Somos parte da terra e ela é parte de nós.
As flores perfumadas são nossas irmãs, os veados, os cavalos a majestosa águia,
todos nossos irmãos. Os picos rochosos, a fragrância dos bosques, o calor do
corpo do cavalo e do homem, todos pertencem à mesma família.
Assim, quando o grande chefe em Washington envia a mensagem manifestando o
desejo de comprar as nossas terras, está a pedir demasiado de nós. O grande
Chefe manda dizer ainda que nos reservará um sítio onde possamos viver
confortavelmente uns com os outros. Ele será então nosso pai e nós seremos seus
filhos. Se assim é, vamos considerar a sua proposta sobre a compra de nossa
terra. Isto não é fácil, já que esta terra é sagrada para nós.
A límpida água que corre nos ribeiros e nos rios não é apenas água, mas o sangue
de nossos antepassados. Se lhes vendermos a terra, recordar-se-á e lembrará aos
vossos filhos que ela é sagrada, e que cada reflexo nas claras aguas evoca
eventos e fases da vida do meu povo. O murmúrio das águas é a voz do pai do meu
pai.
Os rios são nossos irmãos, e saciam a nossa sede. Levam as nossas canoas e
alimentam os nossos filhos. Se lhes vendermos a terra, deveis lembrar e ensinar
aos vossos filhos que os rios são nossos irmãos, e também o são deles, e deveis
a partir de então dispensar aos rios o mesmo tratamento e afecto que dispensais
a um irmão.
Nós sabemos que o homem branco não entende o nosso modo de ser. Ele não sabe
distinguir um pedaço de terra de outro qualquer, pois é um estranho que vem de
noite e rouba da terra tudo de que precisa. A terra não é sua irmã, mas sua
inimiga, depois de vencida e conquistada, ele vai embora, à procura de outro
lugar. Deixa atrás de si a sepultura de seus pais e não se importa. A cova de
seus pais é a herança de seus filhos, ele os esquece. Trata a sua mãe, a terra,
e seu irmão, o céu, como coisas que se compram, como se fossem peles de
carneiro ou brilhantes contas sem valor. O seu apetite vai exaurir a terra,
deixando atrás de si só desertos. E isso eu não compreendo.
O nosso modo de ser é completamente diferente do vosso. A visão de vossas
cidades faz doer os olhos do homem vermelho.
Talvez seja porque o homem vermelho é um selvagem e não compreende...
Nas cidades do homem branco não há um só lugar onde haja silêncio, paz. Um só
lugar onde ouvir o desabrochar das folhas na primavera, o zunir das asas de um
insecto. Talvez seja porque sou um selvagem e não possa compreender.
O vosso ruído insulta os nossos ouvidos. Que vida é essa onde o homem não pode
ouvir o pio solitário da coruja ou o coaxar das rãs nas margens dos charcos e
ribeiros ao cair da noite? O índio prefere o suave sussurrar do vento esfolando
a superfície das águas do lago, ou a fragrância da brisa, purificada pela chuva
do meio dia e aromatizada pelo perfume dos pinhais.
O ar é inestimável para o homem vermelho, pois dele todos se alimentam. Os
animais, as árvores, o homem, todos respiram o mesmo ar. O homem branco parece
não se importar com o ar que respira. Como um cadáver em decomposição, ele é
insensível ao mau cheiro. Mas se vos vendermos nossa terra, deveis recordar que
o ar é precioso para nós, que o ar insufla seu espírito em todas as coisas que
dele vivem. O vento que deu aos nossos avós o primeiro sopro de vida é o mesmo
que lhes recebe o último suspiro.
Se vendermos nossa terra a vós, deveis conservá-la à parte, como sagrada, como
um lugar onde mesmo um homem branco possa ir saborear a brisa aromatizada pelas
flores dos bosques.
Por tudo isto consideraremos a vossa proposta de comprar nossa terra.
Se nos decidirmos a aceitá-la, eu porei uma condição: O homem branco terá que
tratar os animais desta terra como se fossem seus irmãos.
Sou um selvagem e não compreendo outro modo de vida. Tenho visto milhares de
bisontes apodrecendo nas pradarias, mortos a tiro pelo homem branco de um
comboio em andamento.
Sou um selvagem e não compreendo como o fumegante cavalo de ferro possa ser mais
importante que o bisonte, que nós caçamos apenas para sobreviver.
Que será dos homens sem os animais? Se todos os animais desaparecem, o homem
morrerá de solidão espiritual. Porque o que suceder aos animais afectará os
homens. Tudo está ligado.
Deveis ensinar a vossos filhos que o solo que pisam são as cinzas de nossos avós.
Para que eles respeitem a terra, ensina-lhes que ela é rica pela vida dos
seres de todas as espécies. Ensinai aos vossos filhos o que nós ensinamos aos
nossos: Que a terra é a nossa mãe. Quando o homem cospe sobre a terra, cospe
sobre si mesmo. De uma coisa nós temos certeza: A terra não pertence ao homem
branco; o homem branco é que pertence à terra. Disso nós temos a certeza. Todas
as coisas estão relacionadas como o sangue que une uma família. Tudo está
associado. O que fere a terra fere também aos filhos da terra.
O homem não tece a teia da vida: é antes um dos seus fios. O que quer que faça a
essa teia, faz a si próprio.
Nem mesmo o homem branco, cujo Deus passeia e fala com ele como um amigo, não
pode fugir a esse destino comum. Por fim talvez, e apesar de tudo, sejamos
irmãos.
Uma coisa sabemos, e que talvez o homem branco venha a descobrir um dia: o nosso
Deus é o mesmo Deus.
Hoje pensais que Ele é só vosso, tal como desejais possuir a terra, mas não
podeis. Ele é o Deus do homem e sua compaixão é igual tanto para o homem branco,
quanto para o homem vermelho.
Esta terra tem um valor inestimável para Ele, e ofender a terra é insultar o seu
Criador. Também os brancos acabarão um dia talvez mais cedo do que todas as
outras tribos. Contaminai os vossos rios e uma noite morrerão afogados nos
vossos resíduos.
Contudo, caminhareis para a vossa destruição, iluminados pela força do Deus que
vos trouxe a esta terra e por algum desígnio especial vos deu o domínio sobre
ela e sobre o homem vermelho. Este destino é um mistério para nós, pois não
compreendemos como será no dia em que o último bisonte for dizimado, os cavalos
selvagens domesticados, os secretos recantos das florestas invadidos pelo odor
do suor de muitos homens e a visão das brilhantes colinas bloqueada por fios
falantes. Onde está o matagal? Desapareceu. Onde está a águia? Desapareceu.
Termina a vida começa a sobrevivência."

1 comentário:

  1. O ultimo texto do cão é uma coisa espantosa de uma sensibilidade arrebatadora. Parabéns pela publicação, pena que poucos venham a este espaço e captem a mensagem. Abraço.

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Sissi